Todo Mundo quer ser Dono do Fim do Mundo
Ou sobre como parar de se preocupar com o iminente apocalipse
Todo mundo alguma vez na vida pensou no fim do mundo. Eu achei que seria em na primeira Guerra do Golfo, lá no distante janeiro de 1991. O Muro de Berlim caíra no fim de 1989, e o dissolução da União Soviética era só uma questão de tempo, como de fato foi. O Estados Unidos seriam os donos do mundo.
Mas em agosto de 1990, um certo Saddam Hussein não comeu essa conversa e invadiu o Kuwait. De olho no petróleo, os xerifes do mundo, lançaram a operação Tempestade no Deserto em 17 janeiro do ano seguinte. Ali eu tive a certeza de que o mundo ia acabar.
Nem que fosse com alguém apertando por engano o botão da Doomsday Machine, a “máquina do juízo final”, do filme Doutor Estranho, de Stanley Kubrick.
Lançado em 29 de janeiro de 1964, Doutor Estranho chegou em um momento bem “leve” nos Estados Unidos. O presidente John Kennedy fora assassinado dois meses antes, a guerra do Vietnã escalava e as tensões entre EUA e União Soviética só aumentavam.
Como eram as únicas potências que dominavam a arte da destruição em massa, o medo do fim do mundo havia se tornado meio que uma obsessão.
A ideia de Stanley Kubrick era abordar tudo isso de forma séria. Mas à medida o roteiro era escrito em parceria com Peter George (autor do livro Red Alert, no qual Doutro Fantástico é inspirado) e Terry Southern (co-autor de roteiros como o de Easy Rider, dentre outros), Kubrick notou algo de cômico em toda aquela situação.
Perceba bem: cômico, não necessariamente engraçado. Engraçado é aquilo que provoca risos, e rir do fim do mundo pode ser pior do que rir da morte, já que a morte é inevitável. Já o fim do mundo, dizem, ainda pode ser evitado.
No filme, um general maluco ordena que seus comandados ataquem instalações soviéticas, pois a guerra, segundo ele, é “algo sério demais para ficar nas mãos dos presidentes”. O presidente, por sua vez, não consegue chegar a uma solução enquanto o fim da humanidade se aproxima.
Tudo porque se as bombas atingirem os alvos ordenados pelo general, irão ativar a tal “máquina do juízo final” e explodir uma série de bombas nucleares. Tudo seguindo a lógica de que “se mais de um pode destruir o mundo, ninguém vai se meter a besta de tentar.”
A União Soviética ruiu em 1991 e por mais que os Estados Unidos insistam que outros países têm armas de destruição em massa (tentaram com Iraque e Afeganistão, mas não colou), nada foi encontrado. Dizem que Rússia e China podem ter, mas com eles é mais lucrativo fazer negócios do que guerra.
Maravilhoso subtítulo
Doutor Fantástico ou Como Aprendi a Parar de me Preocupar e Amar a Bomba. Hoje a possibilidade de um apocalipse nuclear é praticamente nulo, já que a herdeira da União Soviética (Rússia) e a próxima grande nação do mundo (China) não demonstram pressa em dominar o mundo.
A própria humanidade encaminha sua autodestruição de uma forma mais lenta e perversa, seja pelo consumo indiscriminado e desequilibrado de recursos naturais ou através da mera desinformação e negação da ciência e da própria lógica.
Como dizer que Elon Musk não fez a saudação nazista.
Está na imagem que abre este texto, está nas ideias que ele defende, no que ele fala, em quem são seus aliados. Está tudo ali, mas segundo a comunicação de massa (que não deixa de ser uma arma), ele só quis dizer que seu coração estava com a multidão.
Seria mais convincente dizer que Elon quis emular Herk Vert Liber, um desenvolvedor de armas de origem húngaro-alemã que após a II Guerra Mundial foi para os EUA e adotou o nome de Doctor Strangelove, o Doutor Fantástico.
Na ficção, o personagem que sequer aparece no livro que deu origem ao filme, ainda tenta se conter. No mundo real, seis décadas depois, o homem mais rico do mundo não teve pudores em repetir a saudação de identidade nazista.
O fim do mundo já foi mais divertido. Hoje todo mundo quer ser dono dele.
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